domingo, 12 de setembro de 2010

Capítulo Nove


Capítulo Nove

O que realmente acontece quando os vampiros resolvem dar uma festa.

O ar cheirava tão bem e não eram as muitas rosas vermelhas que estavam espalhadas por toda parte, enfeitando os salões da Mansão Burns, e não eram as velas que iluminavam os cômodos escuros, dando a sensação de calor e deixando tudo dourado, e não eram os incensos que estavam espalhando sua fumaça nenhum pouco perfumada por aí.
Não, não eram as rosas, não eram as velas, não eram os incensos. Eram os humanos.
Os muitos e muitos humanos.
Eles que cheiravam bem, seu sangue cheirava bem.
E eles eram bonitos, atléticos, com o sangue não afetado por drogas, bebidas ou comidas que fazem mal a saúde.
E eles eram tão jovens, ninguém ali passava dos vinte e cinco e o mais novo devia ter no máximo quinze.
“Mãe, eu vou a uma festa muito maneira na casa de uma garota linda que eu conheci a algumas noites, vou voltar tarde.”
Não, você não voltará tarde. Você nunca voltará.
Surpreso?
Os vampiros adoram surpreender, isso os deixa no controle da situação e eles gostam de estar no comando. Sempre.
E a segunda coisa que os vampiros mais gostam?
É enganar as pessoas. É enganar os humanos.
Você conhece uma pessoa com a aparência incrível, uma beleza sobre-humana, – um vampiro- e o que você jamais acreditaria, acontece:
Essa pessoa convida você para uma festa. Uma festa particular, poucas pessoas, guarde segredo. Você irá adorar. Eu estarei lá.
Logo que escurece, um carro aparece a sua porta, buzina, você entra e percebe que os vidros são muito escuros, você não consegue enxergar nada que está do lado de fora, então você não sabe o caminho que está pegando.
A adrenalina faz com que seu sangue se torne ainda mais desejoso. Você também não sabe disso.
Você acha isso emocionante. Vai valer a pena, você lembra a si mesmo quando uma pontinha de medo faz com que você queria ligar para alguém pra avisar onde está indo, – mesmo sem saber realmente pra onde você está indo – e você desiste. Guarde segredo. Essas palavras estão cravadas na sua mente e ficam se repetindo.
Você não se lembra o número de ninguém.
Para que iria ligar mesmo?
Então a porta do carro se abre, você desce vários andares dentro de um elevador, você está vendado, está suando por antecipação, você não sabe, mas isso faz com que todo e qualquer vampiro queira conhecer você o mais rápido possível.
O elevador pára. Alguém te puxa pela mão, você ri bobamente enquanto anda por muitos metros, quilômetros talvez?
Você está cansado, está pensando nos seus sapatos novos, está querendo chegar logo, pergunta se falta muito, a pessoa que está te guiando ri e não responde.
Você sente que o ar aqui embaixo é mais rarefeito e que está muito quente, por isso quase cai de joelhos e agradece aos deuses quando entra em algum lugar com ar condicionado.
Cheiro de rosas. Velas talvez. Incensos?
Risadas, conversas, música tocando ao fundo.
Jazz dos anos trinta?
A festa parece estar animada, você quer tirar a venda, te impedem e sussurram em seu ouvido para ter calma. Vai valer a pena. Os pêlos da sua nuca se arrepiam, se sente sendo medido, observado, comparado, cheirado?
Antes que você possa se sentir assustado, uma taça aparece em sua mão, você bebe o liquido gelado tudo de uma vez sem se preocupar que possam estar te drogando.
A venda some.
Você vê o lugar mais bonito que já viu na vida.
Outra coisa que você não sabe: esse é o último lugar que você vai ver na vida.
Pessoas bonitas como aquelas que aparecem nas revistas estão por todo o lugar, mas aqui ninguém foi “ajeitado” por programas de computador, eles são de carne e osso, você quer tocá-los, quer chegar mais perto, você quer que eles vejam você, você quer dar tudo que é seu para eles... Seu corpo, sua alma, seu sangue...
O mundo a partir de agora se transforma em uma névoa.
E não foi a bebida, ela não estava batizada, vampiros gostam do sangue o mais puro possível e um pouco de champanhe só adoça aquilo que já é doce.
São seus nervos, seus hormônios, é a luxuria, a gula, a avareza, você quer cometer muitos pecados e de todas as maneiras possíveis, você quer tudo e quer agora!
E o desejo está deixando você tonto.
Tem uma mulher beijando o pescoço de um cara um canto, ele está anestesiado de prazer, você não sabe que ela não está beijando e sim sugando o sangue dele, e você nem repara que a cada segundo ele fica mais pálido.
Você não repara em mais nada porque agora você está sendo amarrado em uma mesa e você está sorrindo.
O mundo é tão bonito, sabia?
Não, ele não é. Você sabia disso meia hora atrás, agora você não lembra.
Sua camiseta não existe mais. Onde ela foi parar? Isso importa? Você acha que tem que importar, mas não se lembra por que.
A pessoa mais linda que você já conheceu beija sua boca, chupa sua língua e morde seus lábios e agora não importa mais se o que você gosta é de homem ou de mulher, você quer mais disso, muito mais.
Outra pessoa beija o seu pulso acelerado e outra passa as unhas pelo seu peito. Arde muito, você nem liga. Essa mesma pessoa lambe o lugar em que te arranhou enquanto a que te beijou beija seu pescoço, está queimando, como se ela estivesse raspando facas afiadas sob sua pele. São os dentes dela, dentes de vampiro. É claro que você também não sabe disso.
A pessoa que beijou seu pulso morde você bem ali, no início dói muito, muito mesmo, mas logo você sente o mundo girar, e a endorfina do seu corpo é liberada e você já não sente mais nada, apenas uma sensação maravilhosa, melhor que qualquer orgasmo que já teve na vida.
Na verdade é como se você fosse uma garota perdendo a virgindade, dói, mas logo passa, e você sabe que uma coisa muito boa está por vir.
No seu caso a melhor coisa que pode vir é morte e meu bem, você não sabe disso, não mesmo, mas esta já está chegando,logo, logo.
Aquele que estava beijando seu pescoço resolve parar de usar os dentes para te arranhar e morde de verdade, rasgando sua pele e suga seu sangue, sua vida.
E você morre com um sorriso no rosto.
É isso que acontece com você, humano, quando você vem a uma festa de vampiros.
Tenho convites aqui, você quer? Você não acha que vale a pena?

E a dois metros do garoto de quinze anos que acaba de morrer, está Debora com seu vestido longo, com seu pescoço a mostra, com sua garganta doendo e com a inveja corroendo sua alma.
Ela queria o sangue do garoto.
Ela queria o sangue de qualquer um dos cem humanos que estavam por ali, mas mesmo assim ela sente o estômago embrulhar.
Isso é errado. Isso é errado. Isso é tão errado.                                         
E mesmo assim ela quer, ela quer participar do errado porque parece certo.

E a cinco metros de Debora, está Marcus analisando suas expressões: repugnância, desejo, sede, incerteza, desejo, sede, sede, desejo...
Ela quer fazer o que todo mundo está fazendo, ele sabe disso, então porque ela simplesmente não faz?
Ela está esperando que alguém a convide?
Bom, esse alguém não será ele.

E a sete metros de Marcus, está Viktor com a humana de sangue mais doce, de pele mais macia, de corpo mais bonito da festa em seus braços e entre seus dentes.
Sempre o melhor para Viktor. Sempre o melhor para o Líder.

Debora se sente claustrofóbica, o ar está muito quente, sua garganta está queimando de sede, a pele pinica, ela quer beber o sangue de alguém.
Mas a consciência não deixa.
Sua humanidade não permite.
Então ela sai correndo, sem olhar para trás, esbarrando em vampiros famintos e em humanos sorridentes, ela foge da sede, da perda de sua alma, ela foge de si mesma.

Marcus a segue, desata o nó de sua gravata enquanto corre, esbarrando em vampiros saciados e em humanos mortos.

Viktor suga a última gota de sangue do corpo de Bianca, uma estudante de dezessete anos que nunca mais voltará para casa.

A festa falta muito para acabar.

Debora não quer saber como termina.

Marcus não deixará que ela veja mais nada disso, ele vai salvá-la.

Viktor procura outra presa, ou eu deveria dizer pessoa? Ou vice e versa?
Isso importa?
Não enquanto a festa durar, não enquanto a sede existir e humanos estiverem ali para saciá-la.

A festa falta muito para acabar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário